Antes de mais, em forma de disclaimer, devo afirmar que não sou anti-Vieira. Reconheço-lhe méritos. Entrou no clube num momento complicado e ao nível dos proveitos do clube, trabalhou-se bem: incremento significativo do número de sócios, patrocínios, merchandising, construção de variadas infra-estruturas, etc. Mas o futebol mudou muito nos últimos 15 anos. Podemos afirmar que a Lei Bosman revolucionou o futebol. O número de transferências aumentou exponencialmente, proliferaram os agentes e os salários dos jogadores dispararam. Ao mesmo tempo, assistimos igualmente a um aumento brutal dos valores dos direitos televisivos, o que alavancou o crescimento destes custos.
Estes diferentes factores, tornaram o futebol português ainda mais periférico e distante dos principais campeonatos.
Serve esta introdução para, de forma inequívoca, afirmar que temos vivido nos últimos anos muito acima das nossas possibilidades. A situação financeira do Benfica não é boa. Pior que isso, é preocupante.
Os últimos números conhecidos indicam um passivo de 400M euros na SAD e cerca de 70-75 M no clube. Portanto, neste momento o Universo Benfica tem um passivo a rondar os 475M. O Benfica gastou muito dinheiro em contratações nos últimos 4/5 anos. A uma média de 30M Euros por época, chegamos a valores a rondar os 150M de euros. Dinheiro que não tínhamos e que o clube não gerou na sua actividade. Os prejuízos acumularam-se e para cobrir os défices, foram utilizadas variadas formas: empréstimos obrigaccionistas crescentes, empréstimos bancários e ultimamente “papel comercial”, ou seja, títulos de crédito de curto prazo.
É uma verdadeira bola de neve. Com o aumento das taxas de juro, é previsível que gastemos no fim da época entre 15 a 20M em juros. Este número é por si só, uma barbaridade, e significa por exemplo que, só nesta componente, vamos alocar 1/4 dos nossos proveitos totais. Sob qualquer tipo de prisma, está muito longe de ser uma gestão responsável, isto para não ser menos “simpático” com as palavras.
E ultimamente, o tipo de retórica utilizada por LFV e DSO para comunicar com os sócios e adeptos não tem sido o indicado e é no mínimo enganador. Desde o “basta vender 2 ou 3 jogadores e pagamos o passivo” a “estes prejuízos resultam de uma opção estratégica” entre muitos outros soundbytes, ficamos com a noção que tudo está bem no reino da Dinamarca. Bom, caros benfiquistas, a verdade é que não está. Este blog não tem uma "agenda" nem pretende ser um editorial da "Bola" e, como tal, serve também para alertar para situações como estas. As contas, que são públicas e que qualquer um de nós pode consultar, são claras e indicam que por exemplo em 2011, teremos compromissos financeiros de várias dezenas de milhões de euros a cumprir. O passivo e respectivos custos financeiros (juros) estão a tornar-se sufocantes e a pôr em causa a governabilidade do clube. Não há outra forma de dizer isto sem o fazer cruamente.
Com os bancos a fecharem a torneira a mais financiamentos e com o aumento dos juros, o “preço” do dinheiro aumentou e muito. Restam-nos o naming do estádio, os direitos TV (somente em 2013 a menos que as circunstâncias obriguem a uma antecipação) e…a venda de jogadores.
A venda das nossas 3 jóias mais valiosas (Cardozo, David Luiz e Coentrão) é, a meu ver, inevitável a curto prazo, não só por causa da pressão do mercado, mas também pela pressão do nosso passivo, dos nossos compromissos e da gestão deficitária.
Simplificando, o Benfica não tem um volume de proveitos que permita ter 40M de salários, 25M de outros custos, 15M de juros e ainda gastar anualmente 30 ou 35 em contratações.
O despesismo das últimas épocas não é sustentável com este nível de proveitos e 400M euros não se escondem com “restruturações financeiras” ou “Project finances”. Há que reencontrar o equilíbrio, rapidamente.
Os nossos vizinhos da 2ª circular já acordaram para a realidade e entraram em processo de “downsizing”. Os últimos meses e a última pré-época foram bastante elucidativos quanto a isso.
A situação deles é mais grave que a nossa (o famoso projecto Roquette foi um falhanço a todos os níveis), mas a nossa não é muito melhor neste momento. A continuar assim é somente uma questão de tempo até a bolha rebentar.
Quanto ao clube de Pinto da Costa, goste-se ou não, é quem apresenta uma situação financeira mais desafogada, fruto da política de valorização e vendas de jogadores que tem feito nos últimos anos. Nesse aspecto específico são um caso de sucesso. São, de longe, o clube que mais facturou no mundo inteiro em vendas, particularmente desde 2004/2005. Estamos a falar de valores que ultrapassam os 300M neste período.
Para concluir, torna-se essencial, enquanto não se assinar o novo contrato de direitos de TV, enveredar por uma situação de maior contenção ao nível salarial e ao nível das transferências, criterizando ao máximo as mesmas (sabemos como isso não tem acontecido ultimamente).
Se tal não for feito não há tvs, nem fundos de jogadores, nem 300.000 sócios, que sustentem um passivo que a muito curto prazo pode chegar aos 500M (clube incluído).
É preciso ser responsável e ter a noção que uma dívida desta magnitude irá pôr em causa o futuro do nosso clube, tal como nós o conhecemos.
Tem sido uma gestão de investimento na actividade principal do clube, o futebol, com perspectiva de retorno por via da vitória no campeonato e uma eventual gracinha na Champions. O grande problema desta gestão está na fatalidade dos resultados desportivos não acontecerem fruto da corrupção e dos inumeros tiros nos pés que continuamente vamos dando. A verdade é que um Benfica forte terá proveitos suficientes para fazer face ao serviço da divida e inflacionar o valor a receber pelos direitos televisivos. A ausência de vitória significará um grande problema de futuro, nomeadamente a venda de jogadores e renegociação apressada de direitos por um valor inferior ao espectável.
ResponderEliminarNão condeno a aposta, julgo que investir para vencer é a solução ou foi a solução mais sensata, o grande problema esteve, está e estará na incapacidade de ganhar titulos de forma consecutiva, o que porá o clube em sério risco de sportinguização acelerada com os resultados que se conhecem.
'Passivo' não é o mesmo que 'dívida'. Todo este texto é escrito com base no princípio de que são a mesma coisa. Sugiro um regresso ao 'bê-a-bá' da cadeira de economia.
ResponderEliminarCaro Anónimo: Acho que sei distinguir a diferença...Não me recordo, nas minhas cadeiras de Economia de ter lidado com Balanços e Demonstrações de Resultados...devo ter faltado a essas aulas, certamente.
ResponderEliminarPassivo ou no termo utilizado em inglês liabilities, podemos traduzir como "responsabilidades". Neste caso, garanto-lhe que 90% dos montantes que constam no passivo são efectivamente dívida entre empréstimos bancários, obrigaccionistas, papel comercial, dívidas a outros clubes, dívidas a outros fornecedores (sem ser clubes), etc. São efectivamente montantes em dívida que vamos ter que eventualmente pagar, consoante os prazos estabelecidos.
Sugeria-lhe que em vez de ler as manchetes e ouvir os sound-bytes do nosso presidente, lesse o relatório contas da SAD.
Não teria escrito o que escrevi nem feito as afirmações que fiz sem saber do que falava e muito menos sem pesquisar os dados disponíveis nas contas.
Sugeria-lhe então que lesse o relatório contas e caso tenha alguma dúvida farei os possíveis por esclarecê-lo.
Caro TC: Concordo quando dizes que é necessário investir para gerar retorno.
ResponderEliminarO que afirmei é que estamos num patamar de dívida com níveis muito perigosos e em breve insustentáveis. Os 15 a 20M de juros que se prevêem que se pague durante este exercício são valores perfeitamente descabidos para um clube que factura 65/70M de euros.
Andamos há 5 anos a pagar empréstimos com empréstimos, que cada vez que se renovam são em valor superior para tapar o novo buraco. Somos um clube com 106 anos de história e os nossos dirigentes têm que ter a noção do que é possível fazer sem pôr em risco o futuro do clube. Falaste em sensatez. Estes rácios de dívida são tudo menos sensatos.
MNM, plenamente de acordo, concordo com o que dizes, apenas tentei defender o porquê do investimento principalmente porque acho que o investimento no futebol com retorno desportivo trará receitas suficientes que permitem pagar os juros e amortizar (devagar) as dividas.
ResponderEliminarQuando foi lançado à discussão o último empréstimo obrigacionista eu tive oportunidade de escrever que era contra e as razões que apresentei foram muito similares às que agora inumeras, mas entretanto fomos campeões e o retorno (valorização de plantel, bilheteira, poder junto dos media, etc...) foi muito significativo o que justifica muito do que foi feito em termos de investimento, infelizmente e dado a ausência de sucesso (em perspectiva para este ano) as medidas tendem a tornar-se demasiado pesadas para as receitas ordinárias que vamos tendo.
A impressão que tenho é que a actual direcção vê nos direitos televisivos a tábua de salvação para tamanho encargo (isto se o projecto desportivo falhar) o que é perigoso até porque já vamos percebendo que ninguém se chegará à frente para além da Olivedesportos e não me parece que o nosso canal seja alternativa em termos financeiros.
Em suma, partilho os teus receios apenas acho que poderemos ter saída para esses problemas, para tal não podemos continuar a permitir a eleição de Fernando Gomes e companhia na Liga e FPF e não podemos pactuar com a corrupção que nos inibe de lutar pelo titulo sem que sejamos perfeitos.
A forma como "eles" meteram lá o Fernando Gomes foi genial, tenho que admitir... :)
ResponderEliminarSimularam um desentendimento entre ele o PdC, lançaram o nome do Rui Alves e nós pensámos "Porra esse gajo é que não", quando a intenção inicial era a de meter mesmo o FG...
O que me mete nojo igualmente são as "filiais" que o Porto tem neste momento na 1ª Liga. Leiria e Académica são escandalosos, seguidos por perto por Braga e Nacional. Promiscuidade nojenta.
Quanto aos direitos TV, tenho exactamente a mesma opinião. Estamos à espera que este novo contrato seja a resposta aos nossos problemas.
Só que até lá faltam 2 anos e meio. Não podemos estoirar mais 60 ou 70 milhões até lá. É essa contenção que neste momento é exigível.
"Quanto ao clube de Pinto da Costa, goste-se ou não, é quem apresenta uma situação financeira mais desafogada"
ResponderEliminarnão sei se isto não é para rir. então o Porto que mais tem ganho dinheiro com a LC, que mais facilidade teria para rentabilizar os seus produtos devido as vitórias e mesmo assim tem aumentado o passivo quase todos os anos, é quem está melhor? mas melhor no que? se quando andam a ganhar não reduzem o passivo vão reduzir quando começarem a perder?
o passivo total do Benfica é 470M. e qual é o do Porto? é só o que aparece nos jornais? e que não acredito pois como se tem comprovado quando se fala em números de transferências do Porto os números nunca são verdadeiros. quantas manchetes já se fez com as compras do Benfica acima de 10M? e quantas com os do Porto?? é que os jogadores do Porto só custam os 50, 60 ou 70% que o Porto compra primeiro... mas nunca se faz as contas com a percentagem que é comprada mais tarde...
já o Di Maria, ainda hoje para alguns só foi vendido por 20M... se fosse o mesmo negócio feito pelo Porto diziam sempre que era próximo de 35M.
Tens razão: balanços e demonstrações de resultados deverão claramente ser matéria de cadeiras específicas de contabilidade. Como o meu curso é de engenharia e não de economia, tudo isso estava englobado na cadeira de economia. O erro foi meu.
ResponderEliminarO último relatório e contas da SAD apontava para um passivo de, salvo o erro, cerca de 375M (no clube é de 75M). O tom adoptado pelo texto sugere-me, claramente, a premissa 'passivo = dívida bancária' e o consequente alarmismo, pelo que mantenho a crítica.
Comparações com os rivais são pouco úteis. Eles diluem os números por tudo quanto é sítio, e são incapazes de (leia-se: não querem) apresentar contas consolidadas. O que normalmente levamos na imprensa é com comparações entre os números do Grupo Benfica com os números das SADs dos rivais, o que é o mesmo que comparar alhos com bugalhos.
Não quero com isto dizer que a situação financeira do Benfica deva ser tomada de ânimo leve. É séria, e devemos preocupar-nos com o que se passa. Mas também acho que não devemos deixar-nos levar facilmente pela histeria da comunicação social, que tem por hábito atirar com números de forma leviana, que depois são engolidos de forma ávida e sem questões por uma maioria do público.
Gostei do que li....ou melhor, não gostei...são números assustadores de mais para a minha camioneta.
ResponderEliminarSó os nossos números é que estão consolidados, os outros, dos corruptos e seus submissos não.
Não vamos confundir azeitonas com caganitas de cabrito.
Há uma dúzia de meses acompanhei -meti conversa - com o JAIME ANTUNES desde o estacionamento (Califa) até à nossa Catedral. Falámos de números e ele descansou-me dizendo que, não era um apoiante do LFVieira, - longe disso - mas que os números do nosso clube não o assustavam porque o NOSSO AMADO E GLORIOSO CLUBE tem meios de arranjar receitas que outros não têm e diz-me mais ainda, que o Vieira estava (na altura) no caminho certo.
Estou convencido que, na próxima dúzia de meses (eheheh já viram que comigo é tudo às dúzias...) faremos mais ou menos um negócio entre as transmissões e o naming do nosso estádio, duas grozas de euros em 5 anos. Com jeitinho e arte podemos antecipar depois essas receitas, com poucas dúzias de juros pagos à cabeça.
Não sei se me faço entender, sou fracote em números!!!
Mas do que nós precisamos, era mesmo de duas DÚZIAS de árbitros que não estejam cangados e que não constem da folha salarial do Mafioso, porque essa é que é a MÃE de todas as nossas maleitas.
Só acho que com tantas cadeiras de economia percebes pouco de poda.
ResponderEliminarSem mais.
Viva o Benfica!!