domingo, 26 de maio de 2013

Os perigos do neo-benfiquismo


Não existe com certeza momento mais fácil de se obter boa aceitação por parte dos críticos de Jesus e Luís Filipe Vieira do que este mesmo. Ainda quase nem 2 horas passaram de mais um desaire nesta época desportiva. O terceiro em quase 15 dias. Desta feita na final da taça de Portugal frente ao Vitória de D. Afonso Henriques, no mesmo dia em que nos sagrámos bicampeões de basquetebol e quase ninguém ainda se lembrou do assunto.

Escrevi logo após a final da Liga Europa a “absolver” LFV e poucos dias depois a defender a continuidade de JJ. No entanto, desde esse dia já aconteceu tanta coisa – e tanto detalhe que denota novamente falta de “benfiquismo” no seu sentido mais puro – que me senti pelo menos na obrigação de vir aqui de novo “desabafar” e refletir.

Depois do jogo frente ao Sporting, seguido das vitórias na Madeira e frente aos turcos no estádio da Luz, todos queriam aparecer e ser vistos. Foi o diretor de comunicação a lançar a fogueira, o presidente a recolher os louros e um “ai jesus” de tão limpinho que isto estava.
A verdade também é que grande parte da culpa do “gozo” que hoje transborda os telemóveis, o mural do facebook e a caixa de correio electrónico dos benfiquistas é culpa deles próprios que decidiram seguir o caminho desse discurso arrogante e vitorioso muito antes de o terem sido.

Por incrível que pareça, agora depois de todos os desaires de uma época com resultados desportivos no futebol tão maus como aqueles comparativos com os piores dias de que tanto se distanciam, todos os responsáveis têm permanecido invisíveis. E pior que isso: nem parabenizar o FC Porto (nem sequer através dos comentadores televisivos colegas de direção) pela vitória que lhe caiu no colo, entregue pelas próprias mãos do Sport Lisboa e Benfica, nem mandar a equipa técnica e jogadores esperar pelo capitão do Vitória Sport Clube levantar a taça acabada de conquistar.

Isso não é à Benfica. O Benfica é um clube que se fez grande por ser humilde e mais vencedor que os outros. Mas que defende acima de tudo a educação, a ética e o desportivismo, sendo um exemplo e demonstrando-o principalmente nos dias em que perde. Assim, com estas atitudes, o Benfica continuará a isolar-se dos outros clubes em Portugal e a perder adeptos, como tem feito nos últimos anos e pelos vistos continua.

Não pretendo discutir aqui o futuro de Jorge Jesus. Sobretudo, porque já se começa a perceber que "assará" como o culpado disto tudo (a culpa nunca está sozinha!) e acredito veementemente que "num Benfica A SÉRIO qualquer treinador se arrisca a ser campeão", como dizia Mário Wilson. Por isso mesmo, há semanas que estou cansado de ouvir a palavra “azar”. A palabra “azar” não deveria sequer fazer parte do léxico benfiquista. O que acontece é que muitos adeptos passaram a considerar os 2ºs lugares e as chegadas às finais como suficientes, aplaudindo e elogiando quase ao mesmo nível de termos ganho. Isto faz com que dirigentes, treinadores e jogadores façam aquilo que queiram sem respeitar minimamente quem mais sofre com tudo isto: as crianças e as famílias que se deslocam aos campos e de lá querem sair com alegrias.

Ninguém me tira da cabeça a ideia de que é mais fácil não sofrer um golo no último minuto, do que a outra equipa marcá-lo. O Benfica terá “azar” todos os dias em que cometer 5 erros ao minuto 92 do jogo do título, não souber gerir estrategicamente e emocionalmente uma final europeia e achar que um jogo está ganho a 10 minutos do fim de um jogo que não demonstrou qualquer vontade ou atitude e em que o seu próprio golo foi marcado através de uma “bola de bilhar”. Hoje foi só mais um dia igual a tantos outros de um passado recente irreconhecível e contra todos os pergaminhos.

Não acredito que este resultado venha a alterar em nada o trilho do Benfica. O mais provável é que, de novo, do lado da direção, ninguém venha a público “dar a cara” pelas derrotas ou venha pedir desculpa pelas desilusões consecutivas com uma década de vida. Do outro, a oposição continuará imatura e desorganizada. Por parte dos adeptos, também ninguém irá invadir o estádio com a exigência dos tempos idos, sobrando apenas umas frases em alguns blogs e no facebook. E, até 4ª feira, os benfiquistas já estarão de novo entretidos com uma qualquer estrela sérvia da seleção sub-21 e a contar os tostões para adquirir o Red Pass para a época seguinte.

Estes são verdadeiros perigos para o Benfica e para benfiquismo dos nossos dias. Primeiro o fim da exigência de ganhar. Em seguida, a arrogância de não saber perder e ganhar antes do fim. E, por último, o entretenimento em troca do sentimento de pertença nas decisões do clube.

A alma benfiquista é feita de humildade, nível e vitória. Esse é o caminho. Restará apenas perguntar a quem nos guia se já percebeu que teremos de o fazer todos juntos, com os mesmos valores e com os mesmos princípios, pois, enquanto o Benfica continuar a ir contra a sua natureza, não voltará a vencer de certeza absoluta.

Viva o Benfica ! Aquele que se fez Benfica ! Onde quer que esteja...

6 comentários:

  1. Por muita culpa que o presidente tenha no cartório, deu quase todas as condições para Jesus fazer o seu trabalho. Obviamente foi insuficiente, como tal, não tem condições para continuar, sob o perigo da próxima época desmoronar-se a partir de hoje. Acho que o treinador já não tem muito para dar ao Benfica, nomeadamente em ideias novas. Trouxe bom futebol mas é um perdedor nato!

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  2. Há coisas muito mais graves que perder as 3 finais que disputámos este ano. E essas coisas mais graves fomos perdendo nestes anos de Vieira. Massa crítica, benfiquismo e exigência são tão importantes quanto os troféus. E nós temos perdido em todos os campos.

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  3. O 1º texto lúcido e válido de hoje! Os meus parabéns.

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  4. Os parabéns pelo texto! Muito bem escrito, apesar de eu não ser da mesma cor clubistica.

    Saudações desportivas

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  5. "E, por último, o entretenimento em troca do sentimento de pertença nas decisões do clube."

    Pego nestas tuas palavras para reflectir o meu próprio sentimento de revolta/impotência no meu pior mês enquanto Benfiquista, para dizer, em resumo, a quem não tiver paciência para ler este texto, que mais vale viver a chorar do que apático e resignado.

    Estive ontem no Jamor e pela primeira vez, no final do jogo, olhei para alguns Benfiquistas não como sangue do meu sangue, como sempre foi meu hábito, mas como gente que sai satisfeita por ver palhaços cair das bicicletas, para ter tema de conversa no resto da semana. Vi em mais gente do que desejaria aquele olhar de prazer macabro que se tem quando há um acidente em cadeia numa corrida de fórmula 1. Realizei então que mais do que derrotas aos 92 o que me destrói o coração é ver, num momento tão dramático, a falta de mística, de "uns mesmos valores e princípios". Tenho pena em ver que alguns "benfiquistas" preferem seguir aquela tendência tão portuguesa de pegar nas pipocas quando as coisas correm mal, para depois fingirem-se revoltadas.
    Manter-me-ei sempre fiel a este sentimento e valores que me tornaram melhor pessoa desde o meu primeiro olhar num emblema que por si só bastou para me fazer entrar numa 2ª família, que afinal não está assim tão unida...Felizmente sei que são muitos os "verdadeiros" e que importa olhar para a frente mantendo a chama bem acesa... até debaixo de água. Viva o nosso Benfica!

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